IA
- Falou de segurança. O Algarve tem vividoo um aumento de procura
devido à instabilidade no Mediterrâneo. Os turistas vão manter-se
por cá? Que trabalho podeser feito?
DS
- Penso que este aumento não se deve só a isso. É natural
que os turistas que escolhem a região em função disso, são
turistas que são aconselhados por operadores, por gente que conhece
a região, como conhecem muitas outras regiões no mundo. Quando dão
a indicação que um destino que os turistas devem optar numa fase
destas, tem a ver com fatores que soubemos desenvolver e criar.
Nós
conseguimos em 2/3 anos criar uma imagem, uma intervenção no
território, a perceção que há mais qualidade, mais oferta, mais
diversidade. Isso faz-se com que está lá fora perceba que "a
região tem-se preparado, tem oferta, tem um conjunto de fatores que
são decisivos na escolha. Nós aconselhamos estes turistas a ir para
lá, porque temos confiança". Claramente é o que está a
acontecer.
Em
relação ao futuro, é importante que os agentes do terreno percebam
que isto não pode ser apenas de um ano, mas que têm também de
criar condições para que os que vêm pela primeira vez fidelizem
como muitos que já vêm há muitos anos. O que cada um for capaz de
fazer, capaz de oferecer e não usar e abusar desta oferta para
depois estragar o que for a continuidade durante os próximos anos,
penso que pode ser um factor que pode fazer toda a diferença. Temos
condições para os fidelizar, se mostrarmos que somos a região como
somos, não inventarmos, não vendermos gato por lebre. Estou
convencido que os turistas escolherão no próximo ano no Algarve se
a última imagem que levarem de cá é de gente que os recebeu muito
bem e conta com eles para o futuro.
IA
- Há regiões nacionais que têm vindo a emergir no turismo
nacional. Como é que o Algarve pode reagir?
DS
- O Algarve não precisa de reagir. O País não é assim
tão grande. Estão a emergir, mas são ofertas diferentes. Nós não
podemos ser competitivos com Lisboa ou Porto e mesmo do Alentejo. Nós
temos uma oferta que já por si é muito grande. Essa diferença
vê-se, por exemplo, os turistas na região dormem 4 a 5 noites, em
Lisboa dormem 2, no Porto, dormem 1,5, no Alentejo 1,5 a duas. Nós
não podemos fazer comparações. Tudo isso tem a ver com grandes
aeroportos, como o de Lisboa. Depois têm ofertas de city break,
ofertas patrimonial e cultural que nós não temos. Eles estão a
crescer, nós estamos a crescer, mas a nossa base de crescimento é
bastante alta. Não se nota tanto a diferença, porque subir sobre
dez é uma coisa, subir sobre mil é outra e nós já estamos a subir
sobre mil.
Nós
não somos competitivos, somos diferentes e somos complementares a
esses destinos. Quanto mais gente for para Lisboa e Porto, mais gente
vai para o Alentejo, para o Centro e para o Algarve. E quanto mais
gente vier para o Algarve, mais gente terá condições para ir para
o Alentejo, ou seja, podemos ajudar o Alentejo no número de
turistas, de visitantes e de noite de dormidas. Cada região tem as
suas especificidades, tem as suas ofertas e algumas estão a
trabalhar em conjunto.
InAlgarve -
A que sectores é que o turismo de sol e praia se pode associar?
Desidério
Silva - Pode-se associar a muita coisa, mas é preciso um
reajustamento. Se nós tivermos a trabalhar no cycling, nas
caminhadas, em produtos culturais ou que tenham a ver com natureza,
por vezes há equipamentos que se têm que ajustar a isso. Os hotéis
têm que se adaptar a outras condições para as bicicletas, para
outros meios que podem servir para que as pessoas sintam que aquele
hotel tem uma ligação muito grande com esse serviço. E os hotéis
estão a adaptar-se a isso. Os turistas vêm pelo sol, ficam em
locais onde os hotéis estão bem localizados, mas cada vez mais
procuram atividades complementares, diferenciadoras. Querem novas
experiências, novas atividades, procuram a cultura, a gastronomia,
até os vinhos do Algarve, que há dez anos era impensável falar de
vinhos.
Tenho
feito um grande enfoque muito grande particularmente em toda a zona
de Lagos, Vila do Bispo, Aljezur, Monchique e depois Guadiana,
Alcoutim, Castro Marim, Vila Real, Tavira, e Ria Formosa, o anel que
dá a volta, mas que não é tão focado como as cidades turísticas
mais fortes. É um processo em que estamos apostar fortemente de
maneira a potenciar produtos que sendo importantes, não eram tão
visíveis.
IA
- Algarve foi eleito Marca da Confiança'2016. Como se alcança esse
estatuto?
DS
- Foi uma surpresa. A marca alcançou-se através de votação
dos leitores das 'Seleções do Readers Digest' que escolheram o
Algarve como Marca de Confiança como destino turístico. Foi um
processo natural. Isso só tem um sinal: é sinal da perceção de
quem está de fora, porque utilizou, veio ou desfrutou, entendeu que
é uma região de confiança e isso diz tudo.
As
marcas de confiança para se conquistarem são muito difíceis, para
se perderem são muito fáceis. Há que fazer um esforço muito
grande que continuar a segurar essa confiança como se fosse o melhor
que nós temos. Foi bastante bom esse prémio. É muito bom estarmos
num destino de confiança.
IA
- Vila Real de Santo António criou uma taxa turística. Será
produtivo ou mais prejudicial?
DS
– Eu tenho uma posição clara sobre isso: os Governos
deviam, no âmbito da Lei das Finanças Locais, apoiar e intervir,
financiando os municípios turísticos, que têm claramente verbas de
despesa diferenciadoras entre um município normal. Dou o exemplo de
um município que tem 50 mil habitantes todo o ano e outro que tem 50
mil e passa a ter 400 mil. Esse diferencial, durante um ano, num
município desses, chega a atingir os quase 20 milhões de euros.
Isso são verbas que vêm da autarquia e não é possível criar uma
oferta pública de qualidade, naquilo que é a intervenção pública
da autarquia, nomeadamente na limpeza, na recolha do lixo, na limpeza
das praias, no abastecimento de água, são fatores que vindo
diretamente das finanças da autarquia, obviamente deitam abaixo
qualquer conta da autarquia.
E
quem recebe desse retorno financeiro é o Estado, através do IVA,
dos consumos. Isso tudo faz com que as autarquias fiquem
desequilibradas financeiramente por causa desse serviço público. O
Estado sabe perfeitamente através dos valores de cada município
qual é o diferencial. Nós não estamos ainda numa região
sustentável. Entendo que há outras formas de o fazer. Havia de
haver outra forma de compensação, devia haver uma verba no
orçamento de Estado para fazer face aos custos que advém da sua
intervenção cívica e pública para que o Estado possa ter
receitas.
IA
- O que ainda não foi dito sobre o Algarve?
DS
– Nunca foi feito tanto trabalho conjunto como agora. Há
a necessidade de colocar vários eventos na região entre outubro e
maio, associamos a Região de Turismo à Cultura, já demos uma
listagem de eventos atividades que pensamos importantes no contexto
da região e a Cultura vai fazer o mesmo.
Mas
este é um processo que muito tempo não foi trabalhado. Houve muito
tempo que este Algarve só viveu no sol e da praia e não houve uma
preocupação para encontrar outras soluções, dava para tudo. O sol
e praia são os fatores mais importantes, mas não chega. Os que nós
queremos é outras ofertas e outras complementaridades. Mas não
vamos dar respostas tão rápidas quanto nós queríamos.
Em
relação ao turismo de natureza, felizmente que está a ter um
impacto muito grande. Por exemplo, o Algarve Nature Week é um
sucesso, há a perceção que é importante, as pessoas que vêm, as
experiências que vão ter, as empresas que estão associadas. Há
também a questão das bicicletas e a Via Algarviana. Com a Federação
Portuguesa de Ciclismo, estamos a trabalhar em mais de 40 percursos,
mas é preciso trabalhar os percursos nas questões de cultura,
alimentação, dormidas. São coisas que vão acontecendo e vão
tendo impacto.
Nunca
houve tantas parceiras entre todas a gente, entre a Região de
Turismo, a AMAL, a Universidade, a Escola Hoteleira, a CCDR, há
projetos conjuntos. Há condições para que o Algarve daqui a dois
ou três anos possa ter condições de oferta e sustentabilidade para
todo o ano e não apenas para seis meses. E isso começa-se a notar a
partir do momento em que a taxa de ocupação vai subindo, que só
acontecerá quando chegar entre os 65 e os 70%.