domingo, 15 de maio de 2016

"Futuro da região passa pelo que cada um for capaz de fazer"


IA - Falou de segurança. O Algarve tem vividoo um aumento de procura devido à instabilidade no Mediterrâneo. Os turistas vão manter-se por cá? Que trabalho podeser feito?
DS - Penso que este aumento não se deve só a isso. É natural que os turistas que escolhem a região em função disso, são turistas que são aconselhados por operadores, por gente que conhece a região, como conhecem muitas outras regiões no mundo. Quando dão a indicação que um destino que os turistas devem optar numa fase destas, tem a ver com fatores que soubemos desenvolver e criar.
 
Nós conseguimos em 2/3 anos criar uma imagem, uma intervenção no território, a perceção que há mais qualidade, mais oferta, mais diversidade. Isso faz-se com que está lá fora perceba que "a região tem-se preparado, tem oferta, tem um conjunto de fatores que são decisivos na escolha. Nós aconselhamos estes turistas a ir para lá, porque temos confiança". Claramente é o que está a acontecer.
 
Em relação ao futuro, é importante que os agentes do terreno percebam que isto não pode ser apenas de um ano, mas que têm também de criar condições para que os que vêm pela primeira vez fidelizem como muitos que já vêm há muitos anos. O que cada um for capaz de fazer, capaz de oferecer e não usar e abusar desta oferta para depois estragar o que for a continuidade durante os próximos anos, penso que pode ser um factor que pode fazer toda a diferença. Temos condições para os fidelizar, se mostrarmos que somos a região como somos, não inventarmos, não vendermos gato por lebre. Estou convencido que os turistas escolherão no próximo ano no Algarve se a última imagem que levarem de cá é de gente que os recebeu muito bem e conta com eles para o futuro.
 
IA - Há regiões nacionais que têm vindo a emergir no turismo nacional. Como é que o Algarve pode reagir?
DS - O Algarve não precisa de reagir. O País não é assim tão grande. Estão a emergir, mas são ofertas diferentes. Nós não podemos ser competitivos com Lisboa ou Porto e mesmo do Alentejo. Nós temos uma oferta que já por si é muito grande. Essa diferença vê-se, por exemplo, os turistas na região dormem 4 a 5 noites, em Lisboa dormem 2, no Porto, dormem 1,5, no Alentejo 1,5 a duas. Nós não podemos fazer comparações. Tudo isso tem a ver com grandes aeroportos, como o de Lisboa. Depois têm ofertas de city break, ofertas patrimonial e cultural que nós não temos. Eles estão a crescer, nós estamos a crescer, mas a nossa base de crescimento é bastante alta. Não se nota tanto a diferença, porque subir sobre dez é uma coisa, subir sobre mil é outra e nós já estamos a subir sobre mil.
 
Nós não somos competitivos, somos diferentes e somos complementares a esses destinos. Quanto mais gente for para Lisboa e Porto, mais gente vai para o Alentejo, para o Centro e para o Algarve. E quanto mais gente vier para o Algarve, mais gente terá condições para ir para o Alentejo, ou seja, podemos ajudar o Alentejo no número de turistas, de visitantes e de noite de dormidas. Cada região tem as suas especificidades, tem as suas ofertas e algumas estão a trabalhar em conjunto. 

InAlgarve - A que sectores é que o turismo de sol e praia se pode associar?
Desidério Silva - Pode-se associar a muita coisa, mas é preciso um reajustamento. Se nós tivermos a trabalhar no cycling, nas caminhadas, em produtos culturais ou que tenham a ver com natureza, por vezes há equipamentos que se têm que ajustar a isso. Os hotéis têm que se adaptar a outras condições para as bicicletas, para outros meios que podem servir para que as pessoas sintam que aquele hotel tem uma ligação muito grande com esse serviço. E os hotéis estão a adaptar-se a isso. Os turistas vêm pelo sol, ficam em locais onde os hotéis estão bem localizados, mas cada vez mais procuram atividades complementares, diferenciadoras. Querem novas experiências, novas atividades, procuram a cultura, a gastronomia, até os vinhos do Algarve, que há dez anos era impensável falar de vinhos.
 
Tenho feito um grande enfoque muito grande particularmente em toda a zona de Lagos, Vila do Bispo, Aljezur, Monchique e depois Guadiana, Alcoutim, Castro Marim, Vila Real, Tavira, e Ria Formosa, o anel que dá a volta, mas que não é tão focado como as cidades turísticas mais fortes. É um processo em que estamos apostar fortemente de maneira a potenciar produtos que sendo importantes, não eram tão visíveis.
 
IA - Algarve foi eleito Marca da Confiança'2016. Como se alcança esse estatuto?
DS - Foi uma surpresa. A marca alcançou-se através de votação dos leitores das 'Seleções do Readers Digest' que escolheram o Algarve como Marca de Confiança como destino turístico. Foi um processo natural. Isso só tem um sinal: é sinal da perceção de quem está de fora, porque utilizou, veio ou desfrutou, entendeu que é uma região de confiança e isso diz tudo.
 
As marcas de confiança para se conquistarem são muito difíceis, para se perderem são muito fáceis. Há que fazer um esforço muito grande que continuar a segurar essa confiança como se fosse o melhor que nós temos. Foi bastante bom esse prémio. É muito bom estarmos num destino de confiança.
 
IA - Vila Real de Santo António criou uma taxa turística. Será produtivo ou mais prejudicial?
DS – Eu tenho uma posição clara sobre isso: os Governos deviam, no âmbito da Lei das Finanças Locais, apoiar e intervir, financiando os municípios turísticos, que têm claramente verbas de despesa diferenciadoras entre um município normal. Dou o exemplo de um município que tem 50 mil habitantes todo o ano e outro que tem 50 mil e passa a ter 400 mil. Esse diferencial, durante um ano, num município desses, chega a atingir os quase 20 milhões de euros. Isso são verbas que vêm da autarquia e não é possível criar uma oferta pública de qualidade, naquilo que é a intervenção pública da autarquia, nomeadamente na limpeza, na recolha do lixo, na limpeza das praias, no abastecimento de água, são fatores que vindo diretamente das finanças da autarquia, obviamente deitam abaixo qualquer conta da autarquia.
 
E quem recebe desse retorno financeiro é o Estado, através do IVA, dos consumos. Isso tudo faz com que as autarquias fiquem desequilibradas financeiramente por causa desse serviço público. O Estado sabe perfeitamente através dos valores de cada município qual é o diferencial. Nós não estamos ainda numa região sustentável. Entendo que há outras formas de o fazer. Havia de haver outra forma de compensação, devia haver uma verba no orçamento de Estado para fazer face aos custos que advém da sua intervenção cívica e pública para que o Estado possa ter receitas.
 
IA - O que ainda não foi dito sobre o Algarve?
DS – Nunca foi feito tanto trabalho conjunto como agora. Há a necessidade de colocar vários eventos na região entre outubro e maio, associamos a Região de Turismo à Cultura, já demos uma listagem de eventos atividades que pensamos importantes no contexto da região e a Cultura vai fazer o mesmo.
 
Mas este é um processo que muito tempo não foi trabalhado. Houve muito tempo que este Algarve só viveu no sol e da praia e não houve uma preocupação para encontrar outras soluções, dava para tudo. O sol e praia são os fatores mais importantes, mas não chega. Os que nós queremos é outras ofertas e outras complementaridades. Mas não vamos dar respostas tão rápidas quanto nós queríamos.
 
Em relação ao turismo de natureza, felizmente que está a ter um impacto muito grande. Por exemplo, o Algarve Nature Week é um sucesso, há a perceção que é importante, as pessoas que vêm, as experiências que vão ter, as empresas que estão associadas. Há também a questão das bicicletas e a Via Algarviana. Com a Federação Portuguesa de Ciclismo, estamos a trabalhar em mais de 40 percursos, mas é preciso trabalhar os percursos nas questões de cultura, alimentação, dormidas. São coisas que vão acontecendo e vão tendo impacto.
 

Nunca houve tantas parceiras entre todas a gente, entre a Região de Turismo, a AMAL, a Universidade, a Escola Hoteleira, a CCDR, há projetos conjuntos. Há condições para que o Algarve daqui a dois ou três anos possa ter condições de oferta e sustentabilidade para todo o ano e não apenas para seis meses. E isso começa-se a notar a partir do momento em que a taxa de ocupação vai subindo, que só acontecerá quando chegar entre os 65 e os 70%.

Sem comentários:

Enviar um comentário