quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

"Algarve tem de deixar de ser só sol e praia"



A Associação do Comércio e Serviços da Região do Algarve (ACRAL) está a lançar o projeto Marca 'Produto Algarve', que pretende acrescentar valor aos recursos endógenos. O InAlgarve esteve à conversa com Victor Guerreiro, presidente da Associação, que explica como está a ser desenvolvido o projeto, que pretende criar uma nova dinâmica na economia da região. Em discurso direto e sem tabus, Victor Guerreiro identifica os problemas do Algarve e aponta as soluções.
 
InAlgarve - O que é a marca 'Produto Algarve'? 
Victor Guerreiro - Esta marca 'Produto Algarve' vem na sequência daquilo que a associação entende que passa pela valorização dos produtos da região. Nós temos excelentes produtos, mas não conseguimos acrescentar valor a esses mesmos produtos, por exemplo, no caso dos citrinos. Temos uma laranja, provavelmente das melhores do mundo, há quem diga que é a melhor do mundo, mas de qualquer forma quando ela entra em competição ou em termos de análise com outras laranjas, é tudo laranjas. Eu não consigo depois dizer esta laranja é do Algarve e tem estas características. Este selo, chamado 'Produto Algarve', terá exatamente a diferenciação do que é a laranja do Algarve com a laranja do resto do país ou do resto do mundo. Desse ponto de vista, faz todo o sentido, sendo uma associação empresarial, criar dinâmica e mais valia aos produtos da região no sentido de criar valor. 
 
IA - O que é preciso para os produtos terem o selo 'Produto Algarve'? 
VG - O projeto é feito três fases. Esta foi a primeira fase de identificação e um estudo feito em termos dos produtos e da região, com empresas, produções e produtos, com lojas tradição onde os produtos se vendem. Depois vai ter uma segunda fase, que é de facto as valências e as condições para que o produto justifique ter um selo dessa natureza. Estamos a desenvolver um projeto com a Universidade do Algarve, que será a entidade, do nosso ponto de vista, independente, externa e com know-now, de modo a que ela diga "da análise do produto que fizemos, este justifica o selo, aquele não". O selo 'Produto Algarve' não é só um selo, para os produtos será um selo e para toda a economia. Uma empresa que tenha algum tipo de mais valias, valências identificadas com a região pode ter o selo. A segunda fase é esta.
 
A terceira fase, chamar-se-á Algarve Exportador. Saímos de uma fase em que fizemos um estudo. Normalmente há estudos para todos os gostos, mas depois esses estudos não têm aplicabilidade em termos de economia. Nós entendemos que tínhamos que passar à fase seguinte. Depois de estar encontrada a forma de atribuir o selo, põem-se o problema "como vamos vender os produtos?". Nós temos na região pequenas quantidades de produtos, temos que criar condições para que eles interajam entre si e, quando se apresentem no mercado para vender fora, se apresentem num conjunto e não isoladamente. O que nós entendemos é que o Algarve Exportador terá de ter um stand com dimensão porque vai representar uma região, cuja imagem desse stand será a imagem turística e dentro do stand estão os produtos da região. 
 
O que nós pretendemos é um pouco mais além, criando tecnologia adequada ao sistema, no sentido de alguém que produz dez dúzias de ovos não vai fazer nada, mas se outro tiver, 5, 10, 20 e tal, há possibilidade e capacidade de juntar tudo isso para acrescentar quantidade, no sentido até de se ter possibilidade de poder exportar. No fundo, quando vamos para uma feira internacional, o que se pretende é dizer "na minha região Algarve, o que lá temos é isto, o produto que é 5 toneladas, uma tonelada, meia tonelada, o que for, mas é isto".
 
Não se pretende massificar produto, não temos quantidade para isso. O que pretendemos é acrescentar valor, isto é, hoje, eu com dez toneladas faturo 100 euros, e o que eu pretendo é com as mesmas dez toneladas faturar 150. Isso é acrescentar valor. Isto tem como consequência que, uma associação empresarial tem uma missão fundamental, prioritária, que é criar condições para que as empresas façam negócio, ganhem dinheiro e criem emprego. Desse ponto de vista, entendemos que é nesta conjuntura de união e de promover uma região, acrescentando valor ao que já existe, e que de certa forma, penso que toda a região, nomeadamente o turismo será um turismo diferenciador, introduzindo outras valências. Digamos que é tentar pôr a economia da região funcionar para um bem comum, que é um bem de todos, um bem da região, que é de facto o emprego. Na minha opinião, não há razão nenhuma objetiva para o Algarve ter emprego. 
 
IA - O Algarve já não é só praia e sol? 
VG - É muito ainda sol e praia, infelizmente, do meu ponto de vista. O Algarve tem de deixar de ser só sol e praia. Dir-lhe-ia que, na minha idade, assisti ao desenvolvimento do turismo, há umas décadas, e isso implicou a desertificação do barrocal e da serra algarvia. Na altura não havia gente especializada no turismo, qualquer senhora que trabalhava de enxada assumiu um emprego num hotel, recebia um ordenado fixo ao final do mês e outras condições. Hoje, entendo que se não fizermos o movimento ao contrário, não temos sustentabilidade nem no turismo nem na região. O turismo é o que é, mais hotel, menos hotel, mais percentagem, mais dormida, menos dormida, mas andamos por aqui. Se conseguirmos criar condições para que o Algarve venda todas as suas mais valências, o seu sol para a captação de emprego, de empresas. Nós temos condições para isso, estamos a duas horas/duas horas e meia de todas as capitais europeias e com este clima.
 

Hoje no Algarve, se alguém quiser fazer algum desporto, primeiro aluga um quarto de hotel e depois vai à procura do desporto, nós entendemos que tem de ser ao contrário. Primeiro tenho que oferecer um pacote das várias atividades que tenho aqui e eu porque quero fazer a atividade num clima fantástico, com um regime de segurança, acabo por ter que alugar a casa, comer aqui e tenho que fazer despesa. Temos de ter alternativas diferenciadoras.  

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